sexta-feira, 11 de abril de 2014

Pagar aluguel ou comer no Rio*

Fabio Teixeira/UOL

Não é sexta-feira 13, mas o dia 11 de abril de 2014 amanheceu tenebroso, aterrorizante, desesperador, cinzento e sangrento no bairro do Engenho Novo. Sob a alegação da reintegração de posse e da tão badalada propriedade privada, a Polícia Militar do Estado do Rio de Janeiro retoma seu protagonismo no enredo da criminalização da pobreza, ao passo que a mídia burguesa e seu sensacionalismo desqualificam pessoas sem teto, mascarando o debate sobre a privatização da vida e dos direitos. Enquanto o Governador Pezão e o Prefeito Eduardo Paes acompanham mais esta barbárie em nossa cidade, recursos milionários são aplicados para fins diferentes das necessidades básicas da população fluminense e carioca e estes governantes devem ser responsabilizados.

Na capital dos megaeventos esportivos e da especulação imobiliária, é preciso enxergar além dos que tentam nos permitir ver. Por que um terreno de grandes proporções, capaz de abrigar mesmo que precariamente cinco mil pessoas, encontra-se desocupado e inutilizado durante uma década? Com que intuito interessa à empresa proprietária manter o espaço se seus lucros no ano de 2013 ultrapassaram a marca de um bilhão e quatrocentos e noventa milhões de reais?1 Em vez de a Justiça – burguesa – decidir pela reintegração imediata de posse, com violência, truculência, prisões e mortes, por que não estudar um acordo para manter as famílias no local? Famílias, estas, diga-se de passagem, compostas por trabalhadores e trabalhadoras da região da Zona Norte, que recebem parcos salários e precisam optar entre pagar um aluguel ou comer2, diante dos abusivos preços cobrados em nossa cidade. Cadastrar as famílias para direcionar a outras regiões distantes da cidade e/ou pagar o aluguel social de R$400,00 são paliativos que não contemplam as reais necessidades.

“Se morar é um direito, ocupar é um dever” foi uma pichação que já vi em diferentes locais. E está correta! Se a moradia é efetivamente um direito constitucional, precisamos sim enfrentar a realidade de concentração de terras e riquezas nas mãos de poucos. É simplista e cômodo categorizar como vagabundos e invasores trabalhadores e trabalhadoras tal como nós, mas ansiosos e ávidos por um teto para vive. É simplista o discurso adotado por alguns de que para ter uma casa tem que trabalhar. É querer tapar os olhos diante da realidade ao nosso redor, cujo aumento do preço dos imóveis atinge a marca de 300%3 na região próxima à “Favela da TELERJ” nos últimos dez anos. As políticas de financiamento dos imóveis endividam ainda mais as famílias no país e o percentual de aumento do salário mínimo4 não chega nem à metade deste percentual durante uma década.

Há aproximadamente dois anos e três meses, em São José dos Campos-SP, acompanhávamos e lutávamos contra a violenta desocupação do Pinheirinho5. Hoje, precisamos nos manifestar contra as atrocidades cometidas contra os moradores da ocupação do antigo prédio concedido à Telerj/OI, cuja antiga e bilionária proprietária abandonara o terreno! Um prédio que, cabe destacar, além de tudo, é público e pertence à União. As empresas de telecomunicação são concessionárias de serviços públicos e os bens envolvidos em sua privatização devem retornar à União em 2025.

Se as terras do bairro já foram presenteadas, leiloadas e exploradas, passando por jesuítas e Capitão de Milícias6, é possível e necessário que o espaçoso terreno seja verdadeiramente apossado, fazendo valer o direito à moradia àqueles e àquelas que diariamente constroem essa cidade e hoje não possuem um teto e dignidade para viver com tranqüilidade: trabalhadores e trabalhadoras!

Desapropriação do terreno da Telerj/OI Já! 
Abaixo a truculência e a violência da Polícia Militar! 
Pelo Direito à Moradia!


2 Em entrevista ao RJTV de 11/04/2014, um dos moradores fala: “Ou pagamos o aluguel ou comemos”.
6 História do bairro Engenho Novo: http://engenhonovo-rj.blogspot.com.br/p/historia.html


*Gabriel Marques, professor de Educação Física da rede municipal do Rio de Janeiro